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Viva a tecnologiaO email é algo maravilhoso. Já o era no tempo em que as mensagens eram em ASCII e mais nada. Podia fazer-se muita coisa com ASCII. Desde que as mesmas ferramentas existissem dos dois lados, podia enviar-se todo o tipo de documentos. Um pouco de imaginação permite fazer maravilhas com meios aparentemente limitados. Os recém-chegados à Internet, muitos dos quais nunca chegaram a usar FTP sem ser através de um browser, não fazem talvez ideia do que se conseguia fazer, apesar de tudo, antes da "tecnologia avançada" actual. Quando o acesso de Portugal à Internet não tinha nada a ver com o de agora, e havia números IP em uso sem nomes de domínios registados e acesso TCP/IP apenas nacional para quase todos os mortais, havia no entanto email. Havia servidores por esse mundo fora que recebiam mensagens de email com comandos ftp, processavam os comandos, e devolviam os resultados por email. E foi por essa via que muitos de nós fizeram alguns dos primeiros downloads de software. Nostalgia? Saudades? Definitivamente, não. Ainda bem que agora não é assim. Quanto ao email, ainda bem que temos as Multipurpose Internet Mail Extensions. Podemos enviar/receber email usando o conjunto de caracteres mais adaptado ou inadaptado à linguagem que usamos, incluir documentos nos formatos mais variados, som, imagem, etc., recorrendo a "mail user agents" que nos simplificam a vida. E no entanto, a ideia fundamental, uma das Grandes Invenções da humanidade, é a que está no núcleo, o email propriamente dito. Necessidades diferentes, soluções diferentesSe eu quiser enviar um artigo com equações a um amigo, posso incluir um attachment em TeX, esperando que ele o possa processar. Se ele sabe TeX, até mesmo sem MIME eu posso comunicar uma ou outra equação simples, escrevendo directamente $sqrt{alpha+5}=x^n$ no meio de uma mensagem. Tipos de informação especiais tem necessidades especiais, e, havendo uma base de conhecimentos e tecnologias comum, ela pode ser usada para transferir a informação. Uso TeX há uns 10 anos. Podia enviar mensagens de email comuns na forma de cartas feitas em TeX, de forma a assegurar uma qualidade tipográfica superior, controlando completamente o aspecto visual (algo que o HTML nunca pretendeu fazer). Esta opção seria especialmente interessante agora, visto que se pode configurar os programas de email para, reconhecido o tipo MIME, invocar um programa externo de visionamento. Assim estaria a enviar um documento supostamente mais legível e visualmente apelativo. Mas sinto alguma vantagem em o fazer, no dia a dia, quando quero enviar um recado, combinar algo, trocar longas cartas com amigos distantes, dizer o que vai cá por dentro? Os destinatários iriam gostar? Iriamos, eu e eles, achar que estávamos a melhorar a nossa comunicação por email? Não. A não ser que não tivéssemos mais nada para fazer e estivessemos fascinados com o novo brinquedo. Porque o essencial das cartas pessoais, escritas com caneta em papel ou a ASCII ou ISO-8859-1 ou outro conjunto de caracteres numa mensagem de email são as PALAVRAS, as FRASES, as IDEIAS. A não ser que sejam vazias, conseguem muito bem sobreviver e valer por elas mesmas sem decoração. Até podemos enviar attachments de voz a alguem com quem não falamos pessoalmente há muito tempo. E no entanto, quantas vezes fazemos isso? A situação muda de figura quando estou a enviar algo com exigências especiais, sobretudo algo mais técnico, e sei que isso será conveniente para o destinatário também. Nalguns casos até pode interessar enviar correio em HTML (pessoalmente nunca senti necessidade). Outras vezes em TeX. Ou attachments em milhentos outros formatos. "Nivelamento por cima" ou desprezo pela elegância da simplicidade?A atitude descrita acima é adoptada por muitos de nós (a maioria, diria eu), de forma natural e quase inconsciente, mesmo quando sabemos que dos dois lados está tecnologia com as mesmas possibilidades. Mesmo quando sabemos que tudo o que enviarmos pode ser lido, não nos pomos a exercitar todas as possibilidades da tecnologia "for the sake of it". Mas mais ainda quando não sabemos como vai ser lida a nossa mensagem. Naturalmente, as pessoas tendem muito a usar aquilo que já aprenderam e consideram simples, de forma pouco crítica, e não têm sempre noção do que está envolvido. Alguém que está a iniciar-se agora pode começar por trabalhar primeiro com formatos de documentos de nível alto sem ter percebido o que está envolvido "por baixo". E tendo ferramentas potentes, pode facilmente trocar esses documentos com outras pessoas, eventualmente por email. Pode passar meses ou anos sem sequer saber que pode enviar uma mensagem de email simples em vez de um documento PowerPoint para perguntar aos colegas do piso de cima a que restaurante querem ir almoçar. Para boa parte do trabalho profissional interno a uma empresa, as coisas podem bem ficar assim (se os administradores de sistemas tolerarem a proliferação de recados com duas linhas de texto e 2MB...). Nada contra as interfaces simpáticas e fáceis de usar. Note-se, no entanto, que neste caso alguns dos usos dados aos novos formatos de documentos e às novas possibilidades do email, em detrimento das formas mais simples, resultam, não de sofisticação técnica dos utilizadores, mas de conhecimentos limitados a um domínio mais restrito. Se uma dessas pessoas numa companhia de seguros me enviar um documento promocional em Word ou PowerPoint estará a fazer mau negócio, porque não tenho nem um nem outro e não vou mudar de sistema operativo para ver uma mensagem comercial (ou qualquer outra). Se usarem texto simples vão poder ser lidos por toda a gente. Bom para a comunicação, bom para o negócio. Há naturalmente uma atitude diferente, por parte de alguns que dispõem de mais conhecimentos: "Se esta tecnologia existe, porque não usá-la, em todas as oportunidades? Toda a gente a pode e deve ter; se não acompanharam o progresso, o problema não é meu". Gostar de experimentar formatos e programas novos, aproveitá-los de comum acordo para a troca de informação, não tem qualquer problema. O problema é supor que todos têm possibilidade de dispor dos mesmos meios (e não têm), conhecimentos para os usar (e não têm), e... vontade de os usar. Numa perspectiva equilibrada, penso eu, há vontade de usar meios mais sofisticados e complexos quando se sente que contribuem para melhorar a comunicação; caso contrário, quanto mais simples melhor (notem como constroem as frases quando falam com os amigos mais próximos: são mais complexas, ou dizem muito de forma simples?). Por isso eu e muitos outros, quando recebemos num programa de email simpático e leve, que usamos para quase todo o correio, uma mensagem saturada do HTML pesado que alguns editores "sofisticados" produzem, temos como reacção frequente... apagá-la. Sem ler. Por isso não se admirem se um dia alguém não achar muito romântica a vossa mensagem onde dizem AMOTE . É que do outro lado pode ser que a única ou primeira coisa visível seja <font color="#ff0000"><big>A<big><font><font color="#ccff00">M</font><font color="#00cc00">O</font><blink><b>-</b></blink><strong><i>TE</i></strong> Nunca se esqueçam como a simplicidade pode ser elegante. |
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