Porque é que temos de andar no Gildot a perseguir a cauda do Público? Mesmo que publiquemos depois, temos tipicamente acesso a melhor do que aquilo. Pelo menos nestas coisas, a "Última Hora" do Público parece tender a (pelo menos das vezes que a vi) reciclar a Semana Passada do Slashdot, e nascer já obsoleta com o de Há Uns Dias. Ainda por cima o autor do artigo no Público parece tratar a coisa como um fait-divers levezinho, talvez por falta de consciência do que está envolvido num caso destes em termos de riscos para a liberdade de expressão, riscos ampliados por convenções internacionais (frequentemente dominadas por interesses comerciais/industriais/politiqueiros) discutidas à margem dos parlamentos nacionais, como a da criminalidade informática. A RIAA e a BSA, só para dar dois exemplos mais conhecidos, podem estar interessadas em ter alcance planetário no que toca a perseguir judicialmente tudo que as incomodar na Internet. Mas pouco preocupadas estarão se por exemplo o denominador comum do que for tolerado em termos de liberdade de expressão vier da China ou da Arábia Saudita: - por um lado, porque a única liberdade de expressão essencial para fins comerciais pode perfeitamente ser adaptada de acordo com as vontades do freguês (e nisso até com a China se consegue viver bem agora), seja por redução a algo tão incaracterístico e pasteurizado para consumo universal como um filme Disney seja por ajuste "personalizado" para qualquer regime onde os clientes vivam;
- por outro lado, porque se tudo o resto falhar alguns interessados que estejam sediados nos EUA e mais uma mão cheia de países poderão defender-se de incómodos à sua liberdade aproveitando o facto de terem os paus e as pedras maiores para "esclarecer" dúvidas sobre quem é mais mais ou menos impune, como acabou por acontecer com o Tribunal Penal Internacional.
Só que fora do mundo comercial, há outras formas de discurso menos passíveis de "ajuste" ou "diluição", a não ser que a Internet se torne num molho de documentos invertebrados e politicamente correctos. Essas formas de discurso estão frequentemente muito mais desprotegidas. Imaginemos que um de nós escreve uma página a criticar violações de direitos humanos na China. Qual será a reacção do governo português se o governo chinês insistir q.b. na remoção da dita "difamação"? Aliás, que possibilidades terá o governo para reagir, no quadro legal internacional em desenvolvimento? Invocar a nossa Constituição, aparentemente a ser ultrapassada pelos acontecimentos? E se a lei chinesa entrar assim literalmente pela nossa casa e acabarmos a ser julgados na China, será que teremos a mesma sorte que a ElcomSoft e o Skylarov tiveram com o júri do seu julgamento, apesar de ter sido negado a esse júri o acesso ao texto completo da lei por detrás da acusação? |