Já que estamos bué off topic, e porque eu gosto de colocar as pessoas perante coisas completamente opostas ao que parece "óbvio"... segue um texto quase igual a outro que há uns anos eu escrevi na usenet: A droga é a mais formidável forma de escravatura que jamais existiu. Nas formas antigas, as pessoas escravizadas eram fisicamente aprisionadas e forçadas a trabalhar para o seu amo. O amo fornecia alimento (pois queria que o escravo durasse mais que uma semana) e fornecia o trabalho. Por exemplo, se se tratava de apanhar cana, era para apanhar cana nas terras do amo. Se o amo não tivesse como explorar o trabalho do escravo, não tinha escravo. Com a droga é tudo muito mais fácil para o amo. O drogado não é aprisionado fisicamente, mas através da substância em que se viciou. O amo (aqui traficante) não precisa de fornecer trabalho. Não precisa possuir terras, nem nada parecido. O escravo (drogado) é explorado, não em trabalho, mas em dinheiro. O problema de arranjar dinheiro é com ele. Em termos de impacto na sociedade, a droga é incomensuravelmente pior que a escravatura. Na escravatura clásica, o escravo era explorado mas, apesar de tudo, produzia alguma coisa que servia à sociedade. Na escravatura pela droga, o drogado está quase sempre na situação de não conseguir gerar honestamente dinheiro suficiente para manter o vício, e vê-se forçado a procurar rendimento por meios ilícitos e destrutivos. Em vez de o drogado ser explorado para o bem da restante sociedade, é-o para seu mal. À sua volta aparecem roubos, crimes, violência. Porventura, o drogado torna-se, ele, traficante. O resultado final é tenebroso: Todo o planeta é atravessado por uma cadeia de distribuição em forma de árvore, em que os elementos próximos do topo são os amos e os outros escravos. A máquina funciona de tal forma bem que os amos nem têm que se preocupar em recrutar mais escravos, pois os seus escravos actuais tratam disso. A escravatura clásica, produzindo trabalho útil, podia servir de base a uma sociedade. A escravatura pela droga não pode. Como nada de útil é produzido pela máquina da droga, o seu alimento tem, pelo contrário, que vir do resto da sociedade. A árvore é de facto, um imenso parasita, que devora todo o corpo da sociedade e lhe suga as energias, sem nada dar em troca. Se, por absurdo, toda a sociedade fosse constituída por drogados, a sociedade extinguir-se-ia, pois não restaria ninguém sequer para produzir alimentos. Isto acontece desta forma porque a droga é cara. Se a droga fosse barata, uma muito maior parte dos viciados podia pagar o vício com dinheiro ganho honestamente. Seria igualmente uma forma de escravatura, mas desta vez muito menos prejudicial, podendo até ser comparada com outros vícios não produtivos mas notoriamente inócuos, como assistir às estreias de todos os filmes que aparecem. O escravo-drogado seria explorado, sim, mas conseguiria também produzir trabalho para a sociedade. Não advogando uma sociedade construída com base na escravatura (antiga ou moderna), é evidente que a sociedade seria muito melhor se a droga fosse barata. Como a droga é cara, a quantidade de dinheiro que chega ao topo da árvore é imensa. Acontece que o topo da árvore é constituído por elementos que vivem à margem da sociedade. Aprenderam a viver assim, e por via do fluxo de rendimentos que lhes chega, possuem poder suficiente para se manter à margem. Têm dinheiro que chegue para corromper quem quiserem, e mesmo para sustentar exécitos privados poderosos para o que der e vier. Os lucros da droga são usados para produzir as competências criminosas necessárias, da mesma forma que o dinheiro dos impostos é usado em escolas que produzem engenheiros. A conclusão salta à vista: É crucial que o preço da droga baixe. Isso só se consegue despenalizando completamente a sua produção, comercialização e consumo de todo o tipo de drogas. Enquanto tudo isso for proibido, os riscos inerentes ao envolvimento num negócio ilegal têm que ser cobertos por preços elevados. Enquanto o negócio não for regulado pelas leis comerciais correntes, é regulado pela lei da selva. Surgem crimes associados à conquista de territórios de venda e, muito pior, desenvolvem-se competências para esse género de acções, que podem depois ser estendidas a outros ramos de actividade, como extorsão, corrupção, venda de protecção, exercício de pressão sobre os poderes legítimos da sociedade através do assasínio dos seus protagonistas, etc.. Mas uma medida como a despenalização integral do negócio da droga só interessa se uma parte significativa dos países do Mundo a adoptar, para que o efeito de redução dos preços seja estatisticamente significativo a nível mundial. Casos isolados como o Holandês não servem. E não pode ser tomada sem ser acompanhada do fornecimento de informação adequada às pessoas. As pessoas passariam a ser livres de consumir droga, mas deveriam estar de posse de toda a informação para tomar as suas decisões de forma consciente e ponderada. Esta posição é completamente radical. Como tal, é muito possível que contenha grande dose de exagero. Ainda assim entendi que a devia expôr desta forma brutal, pois estou convencido de que contém, também, uma grande dose de verdade. |